Texto preparado pela Diocese Ocidental de Massachusetts (EUA)
Um monge anglicano, erudito em liturgia, Dom Gregório Dix, da Ordem de São Bento, disse uma vez:
“No coração do cristianismo está a Eucaristia, algo de absoluta simplicidade: o tomar, abençoar, partir e dar o pão, e o tomar, abençoar e dar um cálice de vinho e água, com o novo significado que lhe deu um jovem judeu depois de cear com seus amigos à véspera de sua morte. Ele lhe disse que fizessem isto dali em diante com um novo sentido para recordá-lo e eles o têm feito desde então.
Que outro mandamento foi assim tão obedecido? Século após século, estendendo-se lentamente a todos os continentes e países e entre todas as raças da terra, em todas as circunstâncias humanas que se possam imaginar, para todas as necessidades concebíveis, da infância até a extrema velhice e depois dela, dos pináculos da grandeza do mundo até os refúgios dos fugitivos nas entranhas da terra. Os homens não têm feito nada melhor que isto para os reis em suas coroações e para os criminosos que vão ao cadafalso; para os exércitos em triunfo ou para os noivos em uma pequena igreja rural; para a proclamação de um dogma ou para dar um bom conselho; para a sabedoria do parlamento de uma nação poderosa ou para uma anciã enferma temerosa da morte; para um estudante que espera um exame ou para Colombo saindo para descobrir a América…
E o melhor de tudo, semana após semana, mês após mês, em cem mil domingos sucessivos, fielmente, infalivelmente, através de todas as paróquias da cristandade, os ministros têm feito apenas isto para edificar…o santo e comum povo de Deus”.
Que lugar tem a Eucaristia no culto de hoje?
Segundo o Livro de Oração Comum:
“A Santa Eucaristia é o ato principal da adoração cristã no Dia do Senhor e em outras festas maiores…e um dos ritos regulares designados para o culto público nesta igreja”. LOC – Página 11
A palavra “Eucaristia”
A palavra Eucaristia provém da palavra grega para ação de graças. Sem dúvida, é mais do que uma atitude de gratidão. Inclui nossa resposta aos atos poderosos de Deus e as Boas Novas de Cristo. Dar graças deste modo é nossa “liturgia”, outra palavra que provém do termo grego “o trabalho do povo”. É a obra que o povo de Deus é chamado a fazer.
Quando a igreja se reúne, não é uma reunião acidental de indivíduos que não têm relação entre si. É, antes, uma congregação da família de Deus. O Santo Batismo nos faz filhos adotivos de Deus e, portanto, família da qual faz parte seu Filho Unigênito e os demais.
Nós nos congregamos porque fazê-lo é nossa vocação – nosso chamamento divino, seguindo o exemplo dos apóstolos que, depois da Ascensão do Senhor, se reuniam no primeiro dia de cada semana para “o partir do pão e para as orações” (Atos 2:42).
Mesmo considerando as opções e a flexibilidade que são agora permitidas, ainda seguimos uma ordem para a Eucaristia. Qualquer que seja o rito que usemos ou as opções de que nos valhamos, estamos fazendo a mesma liturgia, e essa é a mesma que a Igreja tem seguido desde os tempos apostólicos. A primeira parte inclui a Proclamação da Palavra de Deus, que consiste nas leituras da Bíblia (incluindo uma passagem dos Evangelhos) e a pregação. A segunda parte é a Celebração da Santa Comunhão, a repetição das ações do Senhor na Última Ceia quando ordenou: “Fazei isto em memória de mim”. A distinção entre as duas partes, ainda que prática, é arbitrária. Na realidade são dois atos de um único drama. A Palavra e o Sacramento se integram mutuamente.
A Proclamação da Palavra
Da mesma forma que seus pais espirituais, os judeus, os cristãos são o povo de um Livro, o povo de uma história. Através das eras históricas, contar e escutar o que Deus fez por nós permite-nos conhecer e proclamar quem somos como povo. Celebramos a bondade da criação de Deus e o amor de Deus revelado em nosso Senhor Jesus Cristo. Celebramos também nossa própria incorporação em sua vida ressuscitada através do Santo Batismo e também “os meios de graça e a esperança da glória” que ele nos dá agora e daqui por diante. E celebramos sua Segunda vinda no final dos tempos em “domínio, majestade, poder e glória” para derrotar para sempre a tudo que é contrário ao Reino de Deus.
Após a leitura do Antigo Testamento e de uma das epístolas, alcançamos o clímax da proclamação ao ler solenemente um dos Evangelhos. Para honrar ao Evangelho, o livro que o contém frequentemente é levado em procissão, acompanhado por acólitos com velas, e às vezes por um crucífero e um turiferário. O Evangelho é proclamado de algum lugar proeminente e a congregação se põe de pé para sua leitura, respondendo com uma aclamação de louvor e ação de graças.
Imediatamente depois do Evangelho vem o sermão, que pretende ser um comentário e uma explicação sobre a Palavra. A congregação responde, dizendo ou cantando a antiga fórmula de fé comunitária da Igreja de Cristo, o Credo Niceno. Também em resposta à Palavra, unimo-nos em oração pelo mundo que Deus criou e ama e pela santa Igreja pela qual Nosso Senhor esteve disposto a morrer. Oferecemos orações também pelos que sofrem, pelos enfermos, pelos que têm problemas e damos graças pelas bênçãos desta vida, oramos por nosso bispo e demais ministros, pela missão e ministério da Igreja em nossa própria diocese e ao redor do mundo.
Em seguida, confessamos nossos pecados – pessoais e coletivos – e recebemos o benefício e a segurança da absolvição de Nosso Senhor, mediante a comissão que deu aos apóstolos e que eles transmitiram a seus sucessores, chegando finalmente através do bispo até nosso presbítero.
Nosso Senhor disse: “Se for ao altar para dar sua oferta a Deus e se lembrar ali de que o seu irmão tem alguma queixa contra você, deixe a oferta diante do altar e vá logo fazer as pazes com seu irmão. Depois, volte e dê a oferta a Deus” (Mateus 5: 23-24). Neste ponto, fazemos as pazes com os que estão adorando perto de nós, trocamos saudações em nome do Senhor e logo procedemos a oferecer nossos dons no altar de Deus.
A Santa Comunhão
Quando Nosso Senhor instituiu a Eucaristia antes de sua morte, fez quatro coisas e essas quatro ações ainda constituem os passos essenciais da Santa Comunhão:
“Tomou o pão” (O ofertório)
O presbítero vai ao altar e recebe o pão e as ofertas em dinheiro dos representantes do povo de Deus. Toma-as e as apresenta a Deus, colocando-as sobre o altar. Hão de usar-se no sacramento e para a obra da Igreja, simbolizando também a oferenda de si mesmo que faz o povo de Deus em resposta ao amor de Deus revelado em Jesus Cristo.
“Deu graças” (A consagração)
Seguindo o exemplo de Nosso Senhor, o presbítero dá graças ao Criador, Deus Pai e recorda a obra salvífica de seu Filho, Nosso Senhor. Pede também que o Espírito Santo santifique tanto a nós como ao pão e vinho, de maneira que sejam o Corpo e o Sangue de Nosso Senhor e Salvador. A presença real de Cristo no Sacramento é a resposta à nossa oração, para que ele possa habitar em nós e nós nele.
“…o partiu” (A partição)
Quando a grande súplica eucarística termina com o Pai Nosso, há um momento de silêncio, dando aos participantes uma oportunidade de refletir com recolhimento e alegria sobre o amor que Deus nos mostrou em Jesus Cristo. Após, o celebrante parte o pão bendito em preparação para que o recebamos e como símbolo do Corpo de Cristo quebrantado por nós na cruz. Então, citando as Escrituras, diz: “Cristo, nossa Páscoa, foi imolado por nós” e o povo responde com alegria: “Celebramos a festa!” (I Cor. 5:7-8).
“…o deu a seus discípulos” (A comunhão)
Quando tudo está pronto, o presbítero se volta para a congregação e a convida a receber o bendito sacramento, dizendo: “Os dons de Deus são para o povo de Deus”. Em seguida, cada um participa do “Corpo de Cristo” e “do Cálice da Salvação” que nos nutrem espiritualmente e são um sinal visível da vida eterna.
Depois que todos tiverem comungado, diz-se uma oração de ação e graças e o bispo, quando presente no altar, ou o presbítero, dão a bênção. Logo após, um diácono diz uma das várias despedidas, a qual respondemos: “Demos graças a Deus” (da Páscoa à quadra de Pentecostes se acrescenta: “Aleluia! Aleluia!”.
Encarnando a Cristo no mundo
A liturgia terminou, mas num certo sentido, a Eucaristia não terminou. A Eucaristia não é meramente o que os cristãos fazem ocasionalmente, mas sim o modo como vivem – em fidelidade, gratidão, alegria e em Cristo. O Corpo de Cristo (a Igreja), tendo se alimentado do Corpo de Cristo (o sacramento), sai agora para cumprir sua vocação de ser o Corpo de Cristo (o instrumento) no mundo: servindo assim, num certo sentido, como a continuação da encarnação e como instrumento nas mãos de Deus para o cumprimento do grande drama da redenção que começou há dois mil anos.
Este trabalho foi preparado pela comissão de liturgia da Diocese Ocidental de Massachusetts da Igreja Episcopal (ECUSA) e foi traduzido para o português por Norton A. Coll.