Santa Maria, 18 de janeiro de 2016.
Irmãos e irmãs,
Conforme expressei anteriormente, não queria fazer nenhum comunicado sob o calor dos debates que se seguiram à decisão tomada pela maioria dos Primazes com relação a Igreja Episcopal dos Estados Unidos – TEC. Ou seja, uma suspensão temporária por três anos de todas as instâncias decisórias da Comunhão, enraizado de sua decisão a respeito do Canon do Matrimônio.Cheguei hoje ao Brasil e desejo compartilhar uma palavra pastoral à Igreja sobre o assunto. Este assunto tomou tempo exagerado da reunião e foi muito difícil para todos os Primazes. A posição mais extremada dos Primazes do GAFCON era exigir um pedido de perdão ou a saída da Comunhão da TEC e da Igreja do Canadá.
Este posicionamento gerou uma reação que levou os Primazes mais ao centro e os mais progressistas a buscarem alternativas que causassem uma drástica ruptura na Comunhão, conforme a própria mídia secular antecipava repetidamente antes e durante a reunião. A resolução final foi o que eu chamo de possível em termos de mantermos os Primazes à mesa e com o desejo de continuar conversando sobre o emblemático terreno da sexualidade. Na decisão tomada, não se incluiu a Igreja do Canadá, vez que ainda não há decisão sinodal definitiva sobre a matéria do matrimônio entre pessoas de mesmo sexo.
O impacto dessa decisão, com certeza, afeta e causa dor não somente na TEC, mas em todas as igrejas que tem atendido ao chamado de Deus em acolher todas as pessoas em suas necessidades pastorais. Conforme o Bispo Michael Curry destacou, a TEC está atendendo um desejo pastoral que não é apenas uma questão cultural, mas uma resposta concreta as pessoas que amam a Deus, servem a Ele e desejam ardentemente seguir a Jesus.
Nossa IEAB tem feito, assim como outras províncias da Comunhão, tem feito o seu caminho de inclusão da comunidade LBGT e dependendo de decisões que se tome nestes dois ou três anos, poderemos viver situações semelhantes a que a TEC vive hoje.
Não há dúvidas de que a Comunhão vive e aprofunda sua divisão. A questão que se coloca é como vamos conviver com esta divisão. Talvez o caminho mais fácil seja evitar o custo de conviver com a diferença. Não é a primeira vez que a TEC vive esta experiência. Mas manteve-se firme no propósito de ser parte e contribuir com a Comunhão. Ela não está sozinha e estamos juntas no caminho da missão.
Uma coisa porém precisa ser destacada. A mídia secular e religiosa parece não ter observado o comunicado final do Encontro dos Primazes, onde se afirma a condenação das igrejas que se omitem (por fragilidade testemunhal) a assumir corajosamente a condenação de atitudes e legislações que insistem em propagar a homofobia e a criminalização das pessoas LGBT.
Igualmente os Primazes assumiram claramente o compromisso com os Objetivos de desenvolvimento Sustentável, com a causa dos Refugiados, com a causa das pessoas vítimas de tráfico humano e com a defesa das vítimas de violência sexual. E lamento que não tenhamos gasto mais tempo discutindo o que a meu ver é realmente relevante para nosso testemunho como Igreja de Cristo.
Isso sem falar do clima de oração que vivemos intensamente durante o Encontro, com a participação nos ofícios diários, na eucaristia, nos momentos de silêncio e jejum que vivemos na cripta da Catedral e na veneração de símbolos como os Evangelhos de Santo Agostinho e do báculo de São Gregório, o papa que enviou Agostinho para evangelizar as Ilhas Britânicas. Pela primeira vez em quase 1500 anos estas duas relíquias estiveram juntas num mesmo lugar!
Precisamos ter a coragem de reconhecer que nossa Comunhão continua dividida. A decisão dos Primazes precisa passar pelo crivo do Conselho Consultivo Anglicano porque este é o único dos instrumentos que tem legitimidade de decidir sobre questões de membresia dentro da Comunhão.
Estarei convocando uma reunião da Câmara dos Bispos para discutir a matéria e construirmos uma mensagem de solidariedade à TEC e oferecermos à Comunhão nossa palavra.
Que Deus nos capacite a ouvir o seu chamado de fazer Jesus ser conhecido e amado por todas as pessoas, independentemente de qual seja a sua condição pessoal. Que a ortodoxia (alegada por alguns) não se torne um empecilho para o avanço do Reino de Deus!
Do Vosso Primaz
++ Francisco
Publicado em 18/01/2016 pelo Serviço de Notícias da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil.