[su_note note_color=”#9cc2e5″]Texto originalmente publicado em 2009[/su_note]
Barreiras ao progresso ainda existem na igreja, diz o clero feminino
[Episcopal News Service – 29/07/2009 – por Nancy Davidge] Ao crescer na década de 1960, vivi em um mundo que claramente definia os papéis para homens e mulheres. A maioria dos pais de meus amigos trabalhavam, e as mães ficavam em casa tomando conta dos filhos e do lar. Das poucas mulheres de que sabia que trabalhavam eram enfermeiras, professoras ou secretárias.
Na igreja havia similares definições por gênero: o pastor era um homem, assim como o bispo que me confirmou. A organista, a secretária da igreja, e as professoras da escola dominical eram todas mulheres. O guardião era um homem, e me recordo que eram mulheres que organizavam a hora do café e dirigiam o “Nearly New”, a loja de usados da igreja.
Em 1974, uma dessas regras mudou. No dia 29 de julho, na Church of the Advocate (Igreja do Protetor) na Filadélfia, onze mulheres foram ordenadas ao presbiterado por três bispos da Igreja Episcopal. À época, foi um momento que transformou a vida, que balançou a igreja de maneira similar à eleição e confirmação de Gene Robinson como bispo da Diocese de New Hampshire em 2003.
Em 1999, no 25º aniversário, o então bispo da Pensilvânia, Robert DeWitt, comentou: “É irônico do que aconteceu 25 anos atrás aqui na Advocate foi interpretado durante um tempo mais como um ato errôneo de três bispos do que um avanço criado por onze mulheres pioneiras. Não se enganem, o evento foi criado pela ação de, por e para mulheres. Os bispos só foram acessórios”.
Ao saber que hoje (29/07) é o 35º aniversário da ordenação de mulheres, eu refleti acerca dessas ordenações e das diversas maneiras que tanto a igreja e o mundo mudaram ou não desde aquela época. Como o mundo no qual cresci, com suas limitações impostas ao o quê garotas e mulheres poderiam fazer, é em muitas maneiras diferente do contexto no qual minha filha com 27 anos cresceu, reconhecendo que ainda há áreas nas quais as mulheres e meninas ainda são marginalizadas.
Em 1974, na recém formada Episcopal Divinity School (EDS), duas das mulheres então ordenadas, Revda. I. Carter Heyward e a Revda. Suzanne R. Hiatt, juntarem-se ao corpo docente (dividindo um posto), com o entendimento de que elas poderiam exercer o ministério ordenado na St. John’s Memorial Chapel (Capela Memorial de São João). Este foi um passo significante, pois na época, a maior parte da igreja não reconhecia a ordenação desas mulheres.
Procurando por vozes contemporâneas, contatei mulheres reverendas e ministras leigas, pedindo para que refletissem sobre o impacto da ordenação feminina em suas vidas. Apesar dessas mulheres terem origens diferentes e diversas faixas etárias, suas reflexões são marcadas por experiências similares.
“Eu nunca tomaria a liderança feminina como ‘dada’”, disse a docente emérita da EDS, Dra. Fredrica Harris Thompsett. “O número de mulheres bispas, reitoras, etc, não cresceu de maneira a refletir nossa população, muito menos entre as mulheres latinas e de ascendência africana. Como Sue Hiatt diria, ´O exército do faraó não foi expulso pelo Mar Vermelho´. A Bispa (presidente) Katharine com certeza é um extra, mesmo assim até ela é mal tratada ou ignorada por muitas lideranças da Comunhão Anglicana”.
A Revda. Jane Gould, pároca na Diocese de Massachusetts, que era uma colega novata em 1974, disse: “Em 1974, escrevi um artigo com razões teológicas a favor e contra a ordenação feminina na Igreja Episcopal. Ao realizar a pesquisa, descobri que as ordenações na Filadélfia foram no 18º aniversário de meu batismo”.
“Um ano depois, tive o privilégio de participar de ordenações em Washington e experimentar a junção de meu ativismo social e minha vida na igreja. A vocação começou a tomar forma pois as corajosas mulheres da Filadélfia e de Washington criaram possibilidades para mim. Sete anos depois, quando cheguei na EDS para meu primeiro ano como estudante de mestrado em teologia (MDiv), com o caminho à ordenação aberto, fiquei admirada ao conhecer Carter Heyward e Suzanne Hiatt como minhas professoras e de ter Alison Cheek na minha primeira aula de Hebraico. Eu poderia prosseguir com minha vocação porque elas haviam forjado o caminho”.
“Trinta e cinco anos depois, meus filhos pressupõe mulheres como diáconas, presbíteras e bispas. E no entanto, como os dados apresentados no almoço da Convenção de Mulheres Episcopais da Convenção Geral tornaram claro, continuam a existir barreiras ao equânime acesso da mulher ordenada à liderança da Igreja”, disse.
Antiga reitora acadêmica da EDS, Revda. Dra. Sheryl Kujawa-Hokbrook, lembra-se de ler sobre as ordenações da Filadélfia na Time Magazine. À época, era estudante secundarista católico-romana, e decidiu fazer seu trabalho de conclusão de curso sobre a ordenação feminina de acordo com sua perspectiva denominacional.
“Dez anos após aquele julho fatídico, eu era episcopal, graduada no seminário, buscando minha própria ordenação”, disse ela, observando que embora tenha experimentado algum sofrimento pela discriminação, ela sabe de outras mulheres que sofreram muito mais.
“Quando me graduei no seminário no início dos anos 1980, poucas mulheres haviam se tornado reitoras; a maior parte de nós vislumbrava o ministério apenas como clero associado indefinidamente. Dadas as limitações, minha própria vocação tomou rumos diferentes com o ministério de jovens, ensinamento e escrita”.
Kujawa-Holbrook continuou, “Sem sombras de dúvidas, os eventos de julho de 1974 transformaram minha vida. Na época, muitos acreditaram que a igreja também se transformaria. Muitas vezes imagino se nós vivemos nas promessas daqueles dias, e se não, onde nós falhamos com aquele sonho?”
“Meu coração é tocado por esse aniversário com profunda e emergente compreensão do que significa uma mulher ser líder em nossa grande e nem-sempre-grande igreja”, reflete a Revda. Eva Cavaleri. Ordenada em 2004, Cavaleri frequentemente senta-se grata aos homens e mulheres em cujos ombros ela está. Mãe de duas crianças, ela descobriu que sua relação com a igreja mudou quando ficou grávida, sentindo menor tolerância na liderança enquanto ao mesmo tempo escutava das pessoas nos bancos da igreja que “trazer minha gravidez e ‘ madura feminilidade’ comigo foi uma profunda experiência espiritual”.
Recentemente, Cavaleri deixou seu posto na paróquia, retornando a Minnesota para tornar-se capelã em um internato Episcopal. Ela compartilha: “Esta mudança parece tão esperançosa, pois acredito que poderia ser uma aptidão autêntica para mim, dado o meu histórico e cuidado com as crianças. Mas sinceramente, imaginei ficar em um ministério pastoral por longo prazo (e honestamente espero voltar), mas a escolha de ir parece não ser uma escolha”.
Como essas histórias ilustram, as mulheres ainda tem um longo caminho até a completa igualdade ser alcançada. “As ordenações da Filadélfia mudaram tudo, mas o trabalho da redenção, o evento central, lançou um processo de mudança que ainda está em curso em seu caminho à materialização”, lembra a Revma. Dra. Katherine Ragsdale, presidente e reitora da EDS. “Quando entrei com o processo de ordenação quase uma década depois, descobri que minha diocese nunca ordenara uma mulher, e nem empregara uma ordenada em qualquer lugar. Até mesmo hoje, os números de mulheres ordenadas na liderança da igreja não são nem um pouco proporcionais ao número de mulheres nos bancos das igrejas, seminários ou púlpitos. Nós tendemos a ficar nas igrejas menores com poucos recursos, salários menores, e menores chances à liderança mais ampla. O trabalho iniciou-se séculos atrás (em Cristo não há masculino ou feminino) e levado a novos patamares na Filadélfia em 1974, mas ainda está incompleto”.
Para todas exceto uma das mulheres entrevistadas, as ordenações de 29 de julho de 1974 representam uma abertura de portas. Mas para Cavaleri, para quem estas portas sempre estiveram abertas, menciona: “Eu era muito ingênua. Eu não tinha ideia de quão difícil essas mulheres trabalharam para mim e para que outras pudessem estar nos locais que (nós) estamos. Esses mais de cinco anos me ensinaram tanto sobre a profunda letargia à mudança em nossa igreja institucional juntamente com sinais de confiança nas bordas”.
Para mim, uma questão permanece: O que mais nós, como fiéis discípulos de Cristo, podemos fazer para continuar o trabalho de Deus neste mundo, e construirmos juntos a visão de uma igreja e de um mundo verdadeiros, a que Deus nos chama a ser?
Trecho de artigo de Nancy Davidge, diretora de comunicações e marketing da Episcopal Divinity School em Cambridge, Massachusetts, EUA.
Uma versão mais longa desse artigo pode ser lida no site da Igreja Episcopal (em inglês).
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Aqui estão algumas informações sobre a ordenação feminina na Comunhão Anglicana:
Pela redação da ENS
Na Comunhão Anglicana, a discussão formal e debate relativo ao ministério da ordenação feminina começou em 1920, quando a Conferência de Lambeth considerou o assunto pela primeira vez.
Florence Li Tim-Oi foi a primeira mulher na Comunhão Anglicana a ser ordenada ao presbiterado em 25 de janeiro de 1944. Sua ordenação causou muita controvérsia após o encerramento da Segunda Guerra Mundial, e Tim-Oi decidiu não continuar a exercer seu sacerdócio até ele ser reconhecido amplamente pela Comunhão Anglicana.
A Conferência de Lambeth de 1948 recusou a reconhecer a ordenação de Tim-Oi, assim como dois sucessivos Arcebispos de Cantuária. Essa conferência reafirmou a decisão tomada em 1930, dizendo que mulheres eram apenas qualificadas a serem diáconas.
A Convenção Geral da Igreja Episcopal decidiu em junho de 2006 por meio da resolução A059 a comemorar anualmente a ordenação de Tim-Oi. A data da comemoração foi marcada para 24 de janeiro.
Na Conferência de Lambeth de 1978, os bispos reconheceram que a Diocese de Hong Kong, a Igreja Anglicana do Canadá, a Igreja Episcopal nos Estados Unidos, e a Igreja da Província da Nova Zelândia começaram a ordenar mulheres ao presbiterado e notaram que “oito igrejas membros da Comunhão Anglicana ou concordaram ou aprovaram em princípios ou declararam que não há objeções fundamentais ou teológicas á ordenação de mulheres ao ministério trino da igreja”.
Hoje, apenas oito das trinta e oito províncias da Comunhão Anglicana ainda não ordenaram mulheres como reverendas. Quatorze províncias atualmente fazem provisões para as mulheres no episcopado.
A Igreja da Inglaterra abriu o presbiterado às mulheres em novembro de 1992, cinco anos após a primeira mulher ser ordenada ao diaconato, e continua a fazer provisões para aceitar bispas mulheres.
O processo envolvido que permitirá mulheres no episcopado na Igreja da Inglaterra é complicado e ao fim precisará o endorso do Parlamento Britânico antes da medida poder ter quaisquer efeitos. Estima-se que – assumindo que todos os estágios legislativos não atrasem – mulheres bispas não serão canonicamente possíveis pelo menos até 2014.
O Sínodo Geral, o mais alto organismo legislativo da igreja, que retomará o tema em fevereiro de 2010, quando espera-se o resultado de um comitê de revisão que tem 12 meses para retrabalhar o rascunho da legislação.[/plain]